Desde os tempos coloniais o município de Lagarto já se projetava como excelente produtor de mandioca (e farinha) que sustentava o comércio e abastecia regiões da economia açucareira. Ainda pujante, esse importante cultivo, empregado de sentidos, criatividade e subjetividade, tornou-se um símbolo da economia e da cultura local. A raspadeira de mandioca é uma representação que simboliza o saber e o fazer desta gente, que produz ingredientes essenciais para a gastronomia nacional (macaxeira, farinha de mandioca, tapioca, puba e seus derivados) e local (folha da mandioca – utilizada na fabricação da Maniçoba, iguaria declarada Patrimônio Cultural Imaterial do Estado de Sergipe pela Lei Nº 8.954/2021), para além de movimentar o setor da agronomia (utilizando-a na produção de rações) e da economia criativa da cidade (através do Festival da Mandioca).

Todo esse processo produtivo, do semear da maniva pela mão do menino que aprende a valorizar sua raiz, ao peneirar da farinha que faz o lavrador reconhecer e classificar o fruto do seu trabalho, tudo está embevecido de significados que lhes chegam pela circularidade cultural e que são por eles insistentemente construídos na dialética temporal. Nesta senda, a lavoura e a casa de farinha deixam de ser exclusivamente espaços de trabalhos para se tornarem espaços culturais, onde o conhecimento, a identidade, a sociabilidade e a cooperação atribuem significados de pertencimento aos processos de preparo e manutenção da roça, da colheita e aproveitamento de sua matéria, da raspagem da raiz e do beneficiamento dos seus produtos.

Esses momentos são valorizados pela tradição popular que afastam as fadigas pelas refeições coletivas que estreitam o intercâmbio cultural e pelo reconhecimento da generosidade humana que retribui com um beiju a solidariedade de um digitório. Reconhecendo essa importância econômica e cultural o Município de Lagarto criou o Festival da Mandioca, um evento que integra diferentes tipos de apresentações artísticas-culturais realizadas nos festejos juninos do lugar. Ele faz parte do Calendário Cívico-Cultural da Cidade, instituído pela Lei Municipal Nº 466/2012, e do Calendário Oficial de Eventos do Estado de Sergipe, sendo considerado Patrimônio Cultural Imaterial do Estado pela Lei N° 8.693/2020.

O Festival da Mandioca é realizado anualmente no mês de junho pela Prefeitura Municipal de Lagarto, através da Secretaria Municipal da Cultura (em parceria com diversas outras secretarias). Trata-se de uma importante política pública de cultura do município que aquece o comércio e o turismo local e historicamente tem atraído milhares de pessoas para sua vasta programação, que agrega: a Pega do Mastro – uma tradição ligada a centenária Silibrina de Lagarto (bem cultural da cidade de Lagarto e do Estado de Sergipe, instituído pela Lei Nº 687/2026 e pela Lei Nº 9.223/23, respectivamente, responsável por recepcionar o mês junino), Escolha da Rainha do Festival da Mandioca, Festejos Juninos da Rua Laranjeiras (reconhecido como patrimônio cultural imaterial do município, pela Lei N° 849/2019), Concurso de Quadrilhas Juninas Éder Santana, Cortejo Folclórico, Casamento do Matuto da Colônia Treze (evento que faz parte do calendário cívico-cultural da cidade, instituído pela Lei N° 693/2016, e reconhecido como Patrimônio Cultural e Imaterial do Estado de Sergipe pela Lei Nº 8817/2021) e Casamento Caipira do Povoado Brejo (evento que faz parte do calendário cívico-cultural da cidade, instituído pela Lei N° 694/2016).

Para além destes atrativos, a festa sempre alcança nichos culturais específicos e outras diversidades de públicos, brindando o centro comercial da cidade com apresentações culturais, ampliando os serviços oferecidos pelo município durante a programação do evento, mobilizando as manifestações culturais locais e regionais e fomentando a economia criativa. O Festival da Mandioca tem um potencial turístico elevado e atrai grande quantidade de visitantes à cidade que buscam conhecer e desfrutar das maravilhas ofertadas pelo cultivo da mandioca, sua festa e tradições.

Tudo isso faz do Festival da Mandioca uma das maiores e mais completas festas de São João do Estado de Sergipe, fornecendo entretenimento cultural e formação técnica para todos aqueles que trabalham com a mandioca, seu comércio e derivados, destacando a cultura e a potencialidade agrícola de Lagarto, município com a maior população rural do Estado de Sergipe.

REFERÊNCIAS:

CASCUDO, Luís da Câmara. História da alimentação no Brasil. Editora Nacional, 1967. Disponível em: http://bdor.sibi.ufrj.br/handle/doc/370. Pesquisado em30 de julho de 2024.

FONSECA, Adalberto. História de Lagarto. Governo de Sergipe, 2002.

FREIRE, Felisbelo. História de Sergipe. 2. ed. Petrópolis. Vozes: Aracaju, Governo do Estado de Sergipe, 1977.

NASCIMENTO, Jósé Uesele Oliveira; ANDRADE, Manoel Ribeiro. A Vida Cultural Lagartense: a cidade de Lagarto como lugar de memória. Revista da Academia Lagartense de Letras, v. 1, p. 71, 2017.

SANTOS, Claudefranklin Monteiro. Contradições da romanização de igreja no Brasil – A festa de São Benedito em Lagarto-SE (1771-1928). Aracaju: Edis, 2016.

Última atualização em 26 de agosto de 2024